terça-feira, 17 de abril de 2018

Um pouco da Professora Neide Pena


Professora Neide em destaque
Como dizia o sábio Mario Quintana: “Não me recorte em fatias, ninguém consegue abraçar um pedaço”. É isso mesmo. Ao tomar a palavra para falar um pouco de mim mesma, considero não apenas ser um gesto de deitar no próprio divã, mas um ato de reflexão e emoção, pois a nossa vida é um movimento de constante e contínua transformação. Todos os momentos são singulares e particulares e constituem a memória que sustenta cada tomada da palavra e cada gesto de ser. Assim, relatar um pouco da trajetória de minha vida e formação, falar de experiências, alegrias e desafios representam apenas um gesto simbólico. Vamos falar de como nasceu uma professora, viveu e vive professora, sempre buscando espaços para aprender, numa sensação de que está sempre em débito, diante das angústias causadas pela falta de conhecimento que fez parte de toda a sua minha.

A minha experiência em educação tem seu berço na educação pública estadual, em meados da década de 1970, em uma cidadezinha no interior de Minas, trabalhando com a cartilha “Caminho Suave”; “Os Três Porquinhos” e, na sequência, em outras séries, convivendo com várias dificuldades e desafios, sendo a falta do livro didático para os alunos e professor um dos principais problemas enfrentados à época. A oportunidade de assumir uma sala de aula de primeiro ano, com crianças de 6 anos de idade, surgiu antes da conclusão do magistério porque havia falta de professores. Eu era ainda tão jovem quanto os alunos, apenas 17 anos. Nossos sonhos e esperanças se misturavam com os sonhos das crianças em fase de alfabetização. Era um exercício de ensinar-aprender e aprender-ensinar. Ainda me lembro com saudade da minha primeira festa do dia do professor: muitas flores do campo organizadas em jarras; pétalas de flores espalhadas pelo chão; declamação de poesias e também muitos presentes, como: perfume de alfazema, sabonetes, bibelôs de cerâmica/louça, tigelas, etc.

Apesar das inúmeras dificuldades por trabalhar e estudar, era munida por um caminhão de sonhos, expectativas e esperanças. Afinal, para quem era filha de pais semianalfabetos, frequentou sala de aula multisseriada na zona rural, trabalhou em serviços do campo desde criança, andava mais de uma hora a pé para chegar a uma escola, enfrentava as estradas desertas e os temporais, além do funil do chamado “Exame de Admissão” para entrar no ginásio, tornar-se professora no início da década de 1970 (1972), era uma grande conquista e o sonho de muitas moças da época e dos seus pais. Era também o meu, motivado pela imagem de uma professora que parecia uma sinhazinha da fazenda: todos os dias ela passava pela estrada, em frente da nossa casa, linda e faceira, montada em uma charrete puxada por dois cavalos imponentes comandados pelos filhos dos empregados, se cobrindo do sol por uma sombrinha cheia de babadinhos. Eu ficava esperando ela passar e a imitava brincando de professora.

Ao longo da minha carreira no ensino público, por questões familiares, tivemos que mudar algumas vezes de cidade e, nessa situação, tive a oportunidade de atuar em realidades diferentes, sempre no estado de Minas: Zona da Mata; norte de Minas e sul de Minas. Fizemos o curso de graduação em Pedagogia, Especialização em Supervisão Pedagógica, Orientação Educacional, Planejamento, Administração e Inspeção Escolar. O curso superior me possibilitou logo atuar na docência em cursos de magistério, no ensino privado e em curso superior, desde o final da década de 1980.

Mãe de três filhos homens, hoje profissionais; vovó de 5 netinhos, lindos e maravilhosos, desde 1994, resido na cidade de Pouso Alegre/MG, por opção. Aqui, foi possível um novo rumo em minha trajetória profissional: atuei por 10 anos em coordenação de sistema de ensino apostilado Anglo; veio o ingresso no mestrado e na docência nos cursos noturnos da Univás (onde atuo até o momento no mestrado em educação e em cursos de graduação, além da coordenação do curso de especialização em gestão educacional). Em seguida, o grande sonho do Doutorado em Educação, na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Novos desafios, agora, pela rodovia Fernão Dias, pela noite e madrugada.

Entretanto, o principal desafio veio mesmo de outra forma: um acidente cirúrgico e quase óbito que, entre outras sequelas, levou à paralisação de uma prega vocal, sinalizando a interrupção de uma carreira que ainda não havia conquistado os sonhos planejados. Enquanto os filhos planejavam, juntamente com o médico, esta interrupção de trabalho para a mãe, eu pensava no tempo necessário para aprender libras e continuar. Não foi preciso aprender libras, mas, sim, muita determinação, sem nunca perder a esperança. Com uma prega vocal e um aparelho eletrônico, a trajetória continua, tudo isso foi apenas uma pedra no meio do caminho. É como se a educação tivesse um tipo de magia, que encanta e energiza movida por pessoas alimentadas por sonhos, expectativas e também fragilidades. Talvez este seja o charme da escola: as pessoas e sem elas, o espaço escolar é apenas um lugar deserto, silencioso e triste.

5 comentários:

  1. Parabéns pela trajetória e conquistas. História de vida que emociona. Motivo de orgulho para as pessoas que te cercam. Avó querida e amada. Angelina, Vini e Victor

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    1. Minha nora querida. Obrigada pelos netinhos maravilhosos e pelas palavras carinhosas.
      Beijos.

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  2. Querida Professora Neide! Muito amorosa com a gente. Uma grande professora, uma referência e exemplo. ❤😚😊

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